Livro: "A política do enquadro"

SINOPSE:

Em 2016, a Polícia Militar realizou, em média, 500 enquadros por hora na capital paulista. Em um só dia, 12 mil casos em que a polícia, sob a ameaça ulterior do uso da força, parou alguém e revistou seu corpo. Nos últimos 20 anos, a taxa de enquadros por 100 mil habitantes apresentou um aumento relativo de quase 400% na cidade de São Paulo e, ao menos desde 2011, gestores da segurança pública referem-se ao enquadro como o “carro-chefe” da atuação policial no estado.Esse processo de transformação do uso dos enquadros foi deflagrado ao fim dos anos 1990, no bojo de um movimento mais amplo de reforma das polícias e racionalização do funcionalismo público, em que a Polícia Militar do Estado de São Paulo desenvolveu uma série de medidas voltada ao aumento da eficiência policial e do enfoque na prevenção e repressão do crime, contexto em que os enquadros emergiram como um atestado de atuação policial proativa e comprometida com a prevenção criminal.Concebidos como medida de produtividade, os enquadros foram estimulados institucionalmente através da política do enquadro, que empreendeu avanços de procedimentalização, qualificação técnica e foco nos resultados; um esforço de burocratização catalisado pelo ímpeto de retomada da direção civil sobre a força policial que, anos após o fim da Ditadura de 64, permanecia refratária ao controle civil.O processo de implementação dessas medidas e os efeitos concretos da sua adoção relevam um processo de acomodação de interesses em que medidas de burocratização voltadas à produção de resultados sob um mote eficientista foram combinadas com a velha tradição da ampla discricionariedade da ação policial, especialmente valorizada entre setores refratários ao controle civil sobre a organização na medida em que mantém indeterminados os limites do poder de polícia.A partir de uma pesquisa detalhada sobre o uso diferencial do enquadro em áreas centrais e periféricas de São Paulo, a autora demonstra que o modo como opera a vigilância policial nas periferias e favelas, marcado pelo uso acentuado de estratégias segregacionistas e táticas intrusivas de policiamento, faz parte de um processo mais amplo e complexo de acumulação de desvantagens sociais que concorrem para a construção de um estereótipo do “suspeito”: o rapaz negro morador da favela, principal alvo dos enquadros.

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