SINOPSE:
Espectros da geografia colonial. Uma topologia da ocidentalização da América. Recife: EDUFPE, 2014.San Brandan, Brasil, Atlântida, Isabela, Amaurota, Vera Paz, Israel, El Dorado, Cibola, Quivira, Henriville, Paititi, o Paraíso, o Inferno, Paraguaçu, Césares são, antes de tudo, nomes. Nomes cujas aparições, repercussões e destinos acompanhamos ao longo destas páginas. Nomes próprios e impróprios de lugares, cuja existência e postulação dependiam de dois imprescindíveis suplementos e predicados: os mapas, que representam as formas e as rotas de um mundo conjectural, e os relatos, orais e escritos, que descrevem espacialidades em modo potencial e que anunciam aquilo que poderá vir a acontecer (a confirmação da descoberta, das riquezas, da gente oculta) a partir das antecipações latentes (os rumores, as hipotéticas provas, as testemunhas de ocasião). Nomes feitos de reverberações míticas, de traduções parciais, de equívocos espalhados em várias línguas pela voz e pela letra. Nomes de lugares que tiveram existência fugaz ou duradoura, que existem (de alguma forma) até hoje ou que quiçá nunca existirão, mas que ocupam, todos eles, posições de privilégio nos diversos estratos que compõem a imaginação moderna colonial.São nomes que durante os séculos coloniais insistem em retornar e se dissipam uma e outra vez nas peculiares interseções de rotas geográficas e projeções imaginárias que marcam a exploração do território americano. Nomes que trafegam entre a possibilidade e a preterição, e transformam a promessa e o acaso em singulares instrumentos de conquista. Esses topônimos não se reduzem a servir como óbvios sintomas de uma vontade nominativa que precisa reescrever a história a partir das suas próprias necessidades, mas operam também como atos performativos, cuja força ilocutória se materializa duplamente, tanto através das incessantes campanhas de exploração e domínio que atravessam os mares, os rios, as montanhas quanto através das crônicas, dos indícios e das conjecturas postuladas em tensas e permanentes negociações com o impossível. Neste trabalho, preferimos não entender esses topônimos como fortuitos rótulos impressos sobre o pano de fundo de uma geografia dada e homogênea, nem como meras ficções que comporiam um eventual dicionário de lugares imaginários, nem como recorrente estratagema que os colonizadores inventam e impõem para assegurar o domínio das populações locais. Muito mais complexos do que essas parciais definições poderiam ajudar a inferir, esses topônimos, como dissemos, se resistem a ser reduzidos a esquemas binários de interpretação e funcionam como condição de possibilidade e instrumentos de configuração de uma geografia submetida aos desígnios da modernidade eurocentrada que se espalha pelo globo a partir da última década do século XV.
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