Livro: "Estudo Biográfico: Meister Eckhart"

A educação e a cultura foram as duas forças motrizes por detrás do desenvolvimento urbano europeu nos séculos XIII e XII. Entre as ordens mendicantes que se instalaram nas cidades estavam os dominicanos (ordo fratrum praedicatorum),dedicados a promover no seu ensino, modo de vida, e pregando o ideal da auto-descoberta do homem — auto-cultivo — como um valor cultural singular. A dinâmica desta auto-descoberta pode ser dita como dupla. Pois, por um lado, o homem descobre-se libertando-se de si mesmo e encontrando- em si mesmo – o que o transcende. Por outro lado, o que o homem encontra em si exibe o seu próprio movimento como tudo o que resta quando a sua auto-descoberta chegou ao seu fim. Neste contexto de desenvolvimento, Meister Eckhart dirigiu a sua análise teórica para elucidar o auto-movimento do intelecto como tal, na sua diferenciação, como um movimento que representa em termos práticos a única forma de vida possível. Na verdade, nesta era de agitação social radical, Eckhart apresentou a dinâmica do intelecto (razão, racionalidade) como a riqueza genuína possuída por aqueles que são pobres em espírito. As suas formulações filosóficas e declarações teológicas serviram, na sua convergência recíproca, para desdobrar em termos teóricos a dinâmica do intelecto com vista a recomendar a prática da razão processiva como forma exemplar de vida. Eckhart explicou estas dinâmicas principalmente com base em textos das Sagradas Escrituras, cujo conteúdo filosófico ele expôs através de argumentos filosóficos – algo que ele foi capaz de fazer porque ele considerava as Sagradas Escrituras como uma obra de filosofia (cf. Echardus, Em Ioh. n. 444; LW III, 380, 12-14: “evangelium contemplatur ens in quantum ens”: “o Evangelho trata de ser insonte na medida em que está sendo”- Aristóteles, como era bem conhecido, tendo definido o objeto da metafísica precisamente desta forma. No entanto, as explicações de Eckhart sobre estas dinâmicas também foram baseadas em teses filosóficas intimamente ligadas às noções das Sagradas Escrituras. Em ambos os casos, alegou dar expressão sem reservas ao novo e raro (nova etrara)napropagação daquela que era para ele a única forma de vida possível: a da razão processiva ou dos processos dirigidos pela razão. Ao fazê-lo, Meister Eckhart dedicou a sua vida à filosofia: como filósofo que segura uma cadeira de teologia na Universidade de Paris, como filósofo que lidera a Ordem Dominicana, e como filósofo ocupando o púlpito do pregador.