Livro: "Ética no Jornalismo 4.0"

Caminhar sobre o movediço terreno da ética é mesmo uma tarefa de não poucos obstáculos. Sobretudo numa era marcada pela quebra de fundamentos e de paradigmas clássicos e pela irreversível entrada da sociedade na era digital, com todas as implicações que isto traz. A transição da chamada modernidade sólida para a modernidade líquida, magistralmente apontada por pensadores como Baumam (2001), assim como a transformação da sociedade dos meios em uma sociedade midiatizada, pontuada por tantos especialistas, implicou em transformações em todos os sentidos da vida humana, mas especialmente em um setor ela significou um obstáculo a mais: na relação ensino-aprendizagem. De forma mais contundente ainda, no ensino de “matéria” tão escassa quanto a ética. Dispersos em meio às incertezas de um mundo no qual velocidade, mobilidade e fugacidade não só rimam, mas também caracterizam os dias que seguem; mergulhados na onda das fake news e da vida virtualizada; imersos em meio a apelos tecnológicos e consumistas de toda sorte, perdidos diante da falta de perspectivas e, ao mesmo tempo, das exigências cada vez maiores sobre os indivíduos, muitos alunos chegam à sala de aula à espera de soluções rápidas para suas demandas sempre urgentes, convencidos de que sabem de tudo o que precisam acessando a internet ou as redes sociais e ávidos por um conhecimento que possam adquirir sem muito esforço. A este cenário pouco animador, emoldurado por uma era de relações e sentimentos fluidos e fugazes, que deixa pouco ou nenhum espaço para valores como compromisso, permanência e durabilidade, um outro pano de fundo se coloca: a tentativa de desvalorização da academia como espaço privilegiado da construção do conhecimento, da troca de ideias e informações, da abertura à reflexão. O fenômeno da “liquefação”, identificado por Bauman, vem atingindo em cheio instituições sociais tradicionais, mas feriu de maneira especial o meio acadêmico e as relações que se estabelecem neste espaço. Mas como atingir os jovens? Como mostrar a importância da reflexão e da conceituação filosófica da ética a estudantes que, em sua maioria, se interessam mais por disciplinas práticas, pelo saber fazer, muitas vezes sem “know how”? Como ensinar ética num mundo em que, em lugar de sentimentos como a solidariedade, cresce a competitividade? Num cenário em que o sucesso – rápido – é o que importa, a qualquer custo, a qualquer preço, de qualquer jeito? Não há dúvidas de que o primeiro contato com a reflexão filosófica sobre ética é mesmo uma provocação e tanto para mentalidades carentes de cartilhas, de apostilas, de princípios fixos capazes de guiá-las. Algumas ideias parecem, num primeiro momento, um tanto abstratas – e o que os alunos querem é a concretude e a segurança das definições, e a possibilidade sempre mais confortável de decorá-las para “passar de ano”, expressão que marca o “desejo de saber” de muitos alunos. Outras propostas soam quase utópicas – e o que eles buscam são as ações possíveis. Rapidamente fica claro que falar a linguagem dos jovens não basta para se comunicar. É preciso despertar seus interesses. E uma das formas de atingir este objetivo é estimulá-los a uma reflexão concreta sobre o tema. Atitudes que, esperamos, acabem com o abismo que separa as universidades das redações – dois campos de ação apenas aparentemente distantes -; criem um ponto de equilíbrio entre teoria e prática; permitam o intercâmbio de ideias e informações; mostrem que a atividade universitária pode e deve estar aliada ao exercício jornalístico e tornem mais fácil e possível alcançar um jornalismo mais ético, capaz de satisfazer aos anseios crescentes da sociedade como um todo.