Livro: "Filosofia no Presente"

Há uma primeira ideia falsa que precisa ser deixada de lado, que é que o filósofo pode falar sobre tudo. Essa ideia é exemplificada pelo filósofo da TV: ele fala sobre os problemas da sociedade, os problemas do presente, e faz. Por que essa ideia é falsa? Como o filósofo constrói seus próprios problemas, ele é um inventor de problemas, ou seja, ele não é alguém que pode ser perguntado na televisão, noite após noite, o que ele pensa sobre o que está acontecendo. Um filósofo genuíno é alguém que decide por conta própria quais são os problemas importantes, alguém que propõe novos problemas para todos. A filosofia é, antes de tudo, esta: a invenção de novos problemas.
Segue-se que o filósofo intervém quando na situação – seja histórica, política, artística, amorosa, científica … – há coisas que lhe aparecem como sinais, sinais de que é necessário inventar um novo problema. Esse é o ponto, o filósofo intervém quando encontra, no presente, os sinais que apontam para a necessidade de um novo problema, uma nova invenção. A questão torna-se então: em que condições o filósofo encontra, na situação, os sinais para um novo problema, para um novo pensamento? É em relação a este ponto, e
a fim de expor os fundamentos para a nossa discussão, que eu quero introduzir a expressão “situação filosófica”. Todos os tipos de coisas acontecem no mundo, mas nem todas são situações de filosofia, situações filosóficas. Então, gostaria que seja: qual é uma situação que é realmente uma situação para a filosofia, uma situação para o pensamento filosófico? Vou lhe dar três exemplos, três exemplos de situações filosóficas, a fim de dar-lhe alguma compreensão do que estou me referindo.
O primeiro exemplo já é, se eu posso colocá-lo assim, filosoficamente formatado. Pode ser encontrado no diálogo de Platão, Gorgias. Este diálogo apresenta o encontro extremamente brutal entre Sócrates e Calículos.