Livro: "FUTEBOL FEMINISTA: ENSAIOS"

Séculos de história cabem numa única partida de futebol. Em dois tempos, “Futebol Feminista: Ensaios” apresenta um jogo que escancara as muitas violências às quais as mulheres são submetidas diariamente. Nos primeiros parágrafos, o leitor compreende que futebol feminino e feminismo são entrelaçados e inseparáveis. A briga pelo direito de jogar bola passa por toda a luta de respeito e inclusão da mulher na sociedade.A leitura traça uma linha do tempo e introduz personagens que tiveram participação nos avanços sociais como se fossem jogadoras de uma partida. Do lado rival, a privação, o assédio, o desrespeito e a violência atuam no ataque, na defesa e no extracampo. Não há como corrigir o atraso do futebol feminino provocado por decisões arbitrárias, como a proibição do esporte em diversos países — incluindo o Brasil — ao longo de décadas. Mas o resultado construído é fruto do trabalho de um grupo heterogêneo, incluindo “jogadoras” que sequer tiveram relação direta com a modalidade e, ainda assim, contribuíram para driblar e enfrentar o machismo e o preconceito.Angela Davis, Leila Diniz, Nísia Floresta e Coco Chanel são algumas das relacionadas. A melhor sacada de apresentá-las como equipe é mostrar que formas de pensar distintas podem ser complementares. É um time que trata de interseccionalidade e expõe não apenas questões de gênero, mas também de raça e classe, mostrando que dentro da mesma luta há diversas reivindicações. Não se trata de reduzir o futebol feminino à vontade da mulher de jogar, mas entender que não há como se livrar de um tipo de opressão sem eliminar outros.Cada minuto deste jogo é precioso. O primeiro tempo pode soar arrastado, com atuações individuais espaçadas e travadas pela forte marcação. Mas a segunda etapa conta com gerações cada vez mais velozes e a positiva constatação de que, quando fechado, o elenco rende muito mais. As mudanças no futebol feminino, assim como na sociedade, vieram para ficar e quem for contrário a elas pode buscar um conselho com Dona Ivone Lara: “A vida foi em frente. E você simplesmente não viu que ficou pra trás”.Juliana Arreguy, jornalista