Livro: "Governo Jânio Quadros: sem retoque"
SINOPSE:
Na intimidade, Jânio suportava conversar sobre a renúncia, assunto explosivo se provocado em público ou em ambiente com muitas pessoas. Um dia, aos próprios amigos, que insistiam em fazê-lo confessar algo mais do que a explicação que dava, respondeu com surpreendente calma:– A verdade sobre a renúncia vocês já sabem. Se quiserem ingressar na ficção, conversem com o Vladimir Toledo Piza, que tem mais de dezoito versões. Escolham uma delas.Fato: “qualquer explicação que se dê à renúncia de Jânio Quadros é insatisfatória”, alguns motivos foram aventados, principalmente por parte dos palpiteiros de sempre e por figuras da classe política da época.“Minhas memórias não virão tão cedo pelo menos enquanto alguns cavalheiros estiverem vivos.”Jânio Quadros, em 29/03/1983
Passemos a analisá-los e submetê-los à critica da razão.
Comecemos pelos que são mais absurdos, por absoluta falta de consistência:
1 – Jânio estava embriagado?A conduta do ex-presidente durante as solenidades do dia do soldado e a altivez e postura com que passou em revista as tropas, zeram essa absurda possibilidade. Também sua firmeza irredutível em optar pela renúncia e a retidão gramatical da carta são incompatíveis com uma mente tomada pelo álcool. “Há quem diga que eu estava embriagado (quando renunciou). Eu passei sete meses em Brasília tomando ocasionalmente cerveja e vinho nacional no almoço.” – Jânio Quadros.
2 – Porque Jânio tinha a mania de renunciar de cargos, ou de ameaçar fazê-lo, isto fez com que brotasse a ideia de que ele era sujeito a surtos esquizoides ou crises temperamentais. A meu ver, o que o “homem da vassoura” fazia, não passava de um jogo de cena planejado, visando obter algum tipo de lucro político. Suas renúncias ou ameaças de renúncias anteriores nunca foram para valer. Em relação ao que se passou no dia 25 de agosto, há que se ter em mente que, conquanto Jânio tivesse se mostrado irredutível quanto a renunciar, ele debateu essa questão com seus ministros e assessores, com total equilíbrio e lucidez. Se foi, de certa forma, vago, ao se referir genericamente à “forças terríveis”, o contexto das palavras que proferiu e o texto da missiva endereçada ao congresso, mostram, claramente, que a decisão resultou de uma longa reflexão e de um bem amadurecido pensamento. Impulsos temperamentais não ocorrem dessa maneira. Há também que se levar em conta que, ainda de madrugada, ele declarou sua intenção ao chefe da casa civil. Destemperamento e surto de natureza psiquiátrica não se sustentam por tanto tempo, nem permitem que a pessoa aja como Jânio agiu, durante as solenidades militares daquela manhã.Afastadas, assim, as hipóteses absurdas, fiquemos com aquela que indica que Jânio Quadros planejou a renúncia, visando algo que pretendia alcançar, mas que não foi por ele admitido ou confessado.“Deixei o governo porque não podia ser presidente. Como podia governar com o embaixador americano ameaçando-me em meu gabinete, pedindo uma brigada para invadir Cuba.” – Jânio QuadrosDizem que Jânio teria pretendido repetir o feito de Charles de Gaulle, o qual renunciou à presidência da França em 1946 e, depois, voltou ao poder, atendendo à solicitação de influentes lideranças políticas e militares, com carta branca para impor o tipo de instituição que necessitava e desejava, para governar a quinta república francesa. Só que isso levou dez anos para acontecer e a trajetória política de Jânio deixa evidente que ele não tinha paciência – e muito menos vontade – para esperar por tanto tempo. Por isso, assim se comentava, ele teria aguardado no Viscount, em Cumbica, que alguém (no sentido de algo maior do que somente uma pessoa) o fosse buscar, para que retornasse triunfante à Brasília, com amplos poderes para governar da forma que desejava.
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