Livro: "Histórias de um menino"

Histórias que se passaram na bela região praiana do Norte cearense (Moitas-Almofala-Itarema-Jericoacoara), envolvendo o menino Elias (pai da autora). O nascimento, a infância e adolescência, junto de seu povo – simples, mas enérgico. Povo alegre, bom de viola, e valente, de “sangue quente”, de cumprir a palavra a todo custo. O menino, recém-nascido, transportado por jumento, dentro dum caçoá, por cerca de 120 Km, de Almofala até Jijoca, onde a família foi escapar da feroz seca. Histórias, fatos verídicos, memoriais e folclore, muito folclore. Belas terras, embora com alguns pontos amaldiçoados.Rica e autêntica linguagem regionalista do matuto cearense, trabalhada com habilidade. Não somente os termos, mas também a semântica e a sintaxe, a poética fala popular. Isto dá mais veracidade aos fatos, torna a leitura mais agradável. E ocorre de tal modo que se o revisor, desavisado ou “zeloso” para com a norma culta da língua, quiser “consertar”, prejudicará irremediavelmente a linha narrativa e a mensagem.A escritora, autora do romance O Buraco, inclui na introdução das Histórias de um menino fatos históricos: o soterramento de Almofala, a bela arquitetura colonial da igreja, construída em 1712 – todo o material vindo de Portugal. A geografia também se faz presente, com exuberantes paisagens cortadas de vegetação e de rios que, abraçados cruzam os morros da hoje turística e paradisíaca praia de Jericoacoara, sem esquecer A pedra furada. Há algumas fotografias, mas estas servem principalmente para realçar o painel das descrições – já autênticas fotografias coloridas, em palavras. E as Furnas? Lá onde nenhuma luz se fixa ou faz efeito, talvez para não se ver a princesa e seu reino encantado.Vai muito além de uma biografia do pai da autora, de muitas aventuras, a começar pelas traquinagens infanto-juvenis, numa família grande, criada na fé e na solidariedade. Seus irmãos, seus ancestrais e outras pessoas, e muita, muita história que seu Elias relembrou, contando à filha. História de vida e “causos estranhos” e “contos do além”, misturados, que se vão perenizar, na expressiva escrita de Michelly, “vendendo o peixe pelo preço que comprou”, em linguagem simples e direta, surpreendente – por que não dizer? Aliás é ele próprio que conta os causos, sem melindres; nada preocupa ao pai nem à filha. Nada de cerimônias; há um decidido compromissos com os fatos e com a linguagem original. Uma sequência de histórias interligadas, tecidas por mãos hábeis. Assim, Michelly faz desfilar os fatos, as cenas, como os capítulos de romance, em primeira pessoa, protagonizado por Seu Elias.